O Contrato - Parte II

04-12-2020


"...porque uma ho não se apaixona: assina contratos!"

Amélia sentia os seus olhos e o seu corpo pesados. Fazia esforço para despertar, mas tudo o que conseguia era um piscar de olhos a cada 10 minutos. A droga que se lhe tinha sido administrada era mesmo forte. Passaram- se três horas. Depois de muita luta, conseguiu finalmente abrir os olhos e erguer a cabeça. Ficou surpresa com o que via. Estava dentro de um jato privado. O seu conforto extremo e aspecto luxuoso denunciavam a sua natureza dispendiosa. Na verdade, tratava-se de um Gulfstream G-650, o jato particular mais caro e veloz até então, com detalhes de cristais, assentos de couro, cabines privadas e extremamente luxuosas e tecnologia de ponta, sem contar com a sua estrutura e os seus dois motores Rolls-Royce BR725 que permitem uma maior pressurização do seu interior.

Envidou esforços para conseguir levantar, mas os mesmos foram reduzidos a nada por uma forte dor de cabeça latejante.

- Ai. - gritou a jovem moça, tendo a mão sobre a cabeça.

De repente viu surgir uma figura na sua frente.

- Bonjour, mademoiselle. Vous êtes bien?

- Bonjour, mas eu não falo o francês. - respondeu Amélia quase que boquiaberta e com olhos crivados na aparência e na vestimenta extremamente asseada daquele homem branco. Era alto, de ombros largos e braços fortes, aquele tipo de homem que toda a mulher tem uma vontade imensa de abraçar, com os olhos castanhos e o cabelo negro. Deu-se conta que desta vez não iria prestar serviços a qualquer um e, portanto, receberia um tratamento VIP.

- Bom dia, menina Amélia. Bem-vinda a bordo. O meu nome é Alfred. Cumprimentei-lhe em francês na tentativa de começar a treiná-la para a nova realidade que lhe espera daqui a algumas horitas.

- Horitas? Onde estamos? Em Maputo já deve ser cedo e a minha família deve estar preocupada comigo .Porq...

- Tenha calma, menina.- interrompeu-lhe Alfred com uma voz tranquilizante. - ontem deixamos uma mensagem à sua mãe em seu nome. O senhor Tozé sugeriu que a disséssemos que a menina foi surpreendida pelo seu namorado com uma viagem para Cape Town .

- O quê? E os meus patrões, o meu emprego? - questionou Amélia num tom de excessiva preocupação.

- Acalme-se. Os seus patrões receberam uma carta de despedida em seu nome. O nosso superior pediu para lembrar à menina que depois deste trabalho não precisará de trabalhar para nenhum restaurante.

- Mas e como faço para falar com a minha família, preciso de falar com a minha mãe.- Amélia proferiu estas palavras com lágrimas nos olhos.

- Não chore, mademoiselle. Aqui tem o primeiro de muitos presentes que lhe esperam nesta missão . Se eu fosse a si, abria-o já.- disse-lhe Alfred, entregando-lhe um embrulho luxuoso e um bouquet rosas.

Amélia recebeu-o, mas quase desistiu de abrir aquele embrulho devido ao se desânimo. Mas pensou por um instante na gentileza com Alfred a tratara até então e ganhou forças para o desfazer. Voilá. Era o último Iphone, banhado a ouro. Em meio a tanta tristeza, Amélia finalmente teve a oportunidade de usufruir de algum instante de alegria. Sempre quisera ter um Iphone, mas quando achava que tinha conseguido reunir recursos suficientes para o comprar, surgia alguma afazer prioritário, tal como o de pagar os tratamentos médicos da sua irmã. No seu caso, a realidade tinha superado o seu sonho, uma vez que não ambicionava o dispositivo banhado a ouro.

- Isto significa que posso ligar à minha mãe?- perguntou a rapariga com os olhos já a brilharem de felicidade.

- Sim, e se quiser, agora. Espero que perceba que não temos a intenção de tornar a sua vida num inferno. Queremos mais é que passe bem para ter uma alta performance na sua missão. Já agora, recomendo que leia o nosso regulamento.

- O que tem de especial nesse regulamento? Um monte de proibições?

- Apenas jogue dentro das regras e viva feliz. Abra a caixa de e-mails para baixar o regulamento. Agora, se me permite, vou servir a sua refeição.

- Não quero nada para já. Muito obrigada. Estou muito ansiosa para falar com a minha mãe.

- Muito bem. Permita-me recordar-lhe que para a sua mãe, estamos a caminho de Cape Town, e já se passam quase seis horas de tempo desde que ela recebeu a sua mensagem. Portanto estamos quase a ...

- A aterrar- Amélia terminou a frase com um suspiro.- Estou ciente disso. Não se preocupe. Já me contentei. Vou jogar dentro das regras e ser feliz.

- Isso mesmo menina. Se precisar de algo, estou sempre aqui para si.

- Muito obrigada. Agora vou ligar à min há mamã.

Trrrim-trrrim...

- Olá, mãe.

- Amélia, filha, és tu?

- Sim, mãe. Podes falar?´

. Sim, posso.

- Vou então ligar a câmera. Tens é que ligar a tua também.

- Oi, minha linda. Estou tão chateada e preocupada contigo. Estás com a cara de quem acaba de acordar.

- Sim, mãe. acabo mesmo de acordar. Já estou quase a chegar em Cape. Ligo-te depois de me recompor para falarmos melhor.

- Desde quando é que tens internet no avião?

- Mãe, hoje em dia os aviões já disponibilizam a internet para os seus passageiros. Mas também não estou num avião qualquer. Estou num jato privado, daqueles dos filmes, sabes?

- Jato privado? Mas quem é esse teu namorado? Voltaste com o gringo, o Scot?

- Sim, aliás, mais ou menos. Eu depois conto as novidades. Liguei para que vejas que estou bem. Beijo e amo-te muito. Faria tudo por ti e pela nossa família.

- Nós também, princesa. Até logo. Cuida-te e não te esqueças de ligar ao chegar.

Amélia mergulhou numa tristeza profunda após o término daquela chamada. Fazia aquele sacrifício para preservar a vida dos seus. Tinha-se metido com malfeitores e este era o preço que tinha de pagar. Cogitou a hipótese de pedir algo para comer, mas preferiu voltar a dormir outra vez.

Algumas horas depois ouviu uma voz chamar pelo seu nome.

- Menina Amélia, chegamos ao nosso destino. Precisa de alguma ajuda para desembarcar?

- Não, não preciso. Muito obrigada.

Desprendeu o cinto e pôs-se em marcha para abandonar a aeronave. Não pôde resistir ao design requintado e as clores clássicas do interior; aquela atmosfera era mesmo de gente rica, aliás, milionária. Nunca tinha estado nalgum lugar igual. De repente, viu-se abater por uma tristeza, afinal, não sabia para que organização mafiosa ia fazer aquele trabalho, mas aquele luxo indicava que eram pessoas poderosas, e quanto maior o poder, maior o perigo.

Desceu o primeiro degrau com sucesso, mas quase que tropeçava no segundo de tamanha admiração ao observar a imensa e luxuosa propriedade a escassos metros de si.

Foi conduzida até aqueles que seriam os seus aposentos nos próximos dias. No caminho ao seu destino, Amélia ficava impressionada com o que via. Candeeiros de cristal, mobília de primeira, cores clássicas, aroma agradável, extremo asseio, empregados muito bem aprumados, iluminação devidamente regulada, decoração XPTO, uma atmosfera nunca antes experimentada pela jovem. Começou a pensar no quão bom seria morar ali com a sua família. Pensava no quão contente a sua mãe ficaria se tivesse uma sala enorme e luxuosa daquelas, e logo esboçou um sorriso. De repente, o seu devaneio foi interrompido por uma mulher.

- Bonjour, je suis madame Monique. - Saudou-lhe Monique, exalando confiança, inteligência, e sensualidade. Tudo numa só mistura.

- Bonjour, madame Monique. Infelizmente já deve saber que eu não falo o francês. - respondeu-lhe Amélia com os olhos crivados nos sapatos daquela mulher. Eram de salto muito alto e fino, talvez de tamanho 16, não tinha a certeza. Eram vermelhos, e pelo brilho e material, deviam ser extremamente caros. E aquela mulher pilotava-os com uma destreza sem igual. Decidiu mudar de foco e foi percorrer o resto do traje de Monique. Um vestido preto curto, justo e decotado, cabelos longos e sedosos, unhas vermelhas e bem feitinhas, pele de pêssego e batom vermelho. De repente, deu-se conta do quão elegante era também o físico de Monique , certamente que tinha muita disciplina em matéria de exercício físico e alimentação.

- Sei sim, chérie. E eu estou exatamente aqui para resolver os teus problemas. Podes chamar-me solução, se não souberes dizer madame Monique. - Disse-lhe num tom de brincadeira a mistura com ironia.

- Isso foi mesmo engraçado. Bem, pelos vistos estou na presença daquela que vai guiar os meus passos nesta missão.

- Sim, sou eu mesma. Desde o idioma até às mais obscuras regras de sedução. - Respondeu-lhe Monique com já com os braços cruzados, mantendo sempre a postura erecta.

- Regras de sedução obscura? Pelos vistos isto será uma formação em todos os aspectos da vida.

- Em quase todos. Lembra-te que para vencer uma batalha, temos de estar suficientemente treinados para sermos capazes de analisar os passos do nosso adversário e responder à altura com todas as armas à disposição.

- Interessante. E qual seria a regra número um do conjunto?

- Bem, pela natureza do trabalho, eu diria que a número um é "não te apaixonarás". Acredito que saibais o porquê!

- Essa é simples. A paixão colocaria o trabalho em risco.

- Muito bem. Em outras palavras, porque uma hoe não se apaixona: assina contratos. - proferiu estas palavras em jeito de conclusão, tirando das mãos de um dos empregados ali presentes um contrato para ser assinado por Amélia.

- E este é o meu contrato? - perguntou Amélia ainda impressionada com a atitude e elegância daquela mulher. Quem devia ela ser? Como chegou até aquela organização e conquistou aquela posição? Será que teria passado por muito para se tornar naquela mulher intimidadora ao mesmo tempo que apaixonante? Amélia não se parava de perguntar.

- Sim, este é o seu. Leia-o com muita atenção para fixar as sanções, assim como os benefícios que o mesmo tem a oferecer. Agora, podes continuar a tua peregrinação aos teus aposentos. Descança o quanto precisares. Começamos amanhã. Vai pensando em qual seria a segunda regra de sedução. Au revoir. - despediu-lhe Monique sem nem mesmo esperar para ouvir qualquer que fosse a resposta da jovem. Enquanto isso, Amélia permaneceu estática durante poucos minutos, apreciando o andar altivo e misterioso daquela mulher.

To be continued....

Cláudia Beth - Blog pessoal
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